SEM ESPAÇO PARA A POLÍTICA

Marcos Pontes
21/07/2006

Na última quinta-feira, dia 20 de julho, aniversário de Santos Dumont, fiz uma palestra, utilizando tecnologia de videoconferência, diretamente desse escritório aqui na NASA em Houston. Simultaneamente, pude falar com cinco auditórios diferentes no Brasil. Centenas de pessoas. Muitas perguntas sobre o programa espacial, Força Aérea, vôo tripulado, Estação Espacial, planos futuros, etc.
Entre todas elas, a freqüência do questionamento sobre eu entrar ou não para a vida política chamou a minha atenção. Todos ouviram a mesma resposta simples: “Não! Eu não sou candidato a nada nas eleições de outubro!”.

A impressão que eu tenho é que nós, brasileiros, procuramos desesperadamente por alguém que possa, como passe de mágica, resolver todos os problemas que assolam o país nesses dias. As eleições de outubro aparecem como um catalisador que “poderia” desencadear reações instantâneas que teriam como produtos: uma vida mais justa, menos violência, mais educação, menos medo, mais empregos, menos pessoas que falam, mais pessoas que fazem. Mais ou menos isso.
Acordei pensando sobre isso. Também tenho essas mesmas esperanças. Esses mesmos sonhos. Incomoda a sensação de impotência perante todo esse cenário. “O que é que eu poderia fazer?”, nos perguntamos indignados. A frase de Ghandi, “qualquer coisa que você fizer será insignificante, mas é essencial que você faça a sua parte”, consola o coração inquieto. Contudo, além da necessidade de “fazer” essa parte, também é necessário fazer bem feito.
É aí onde entra o meu ponto sobre esse assunto de política. Noto que existe uma certa confusão com relação as minhas habilidades profissionais. Sou engenheiro, piloto e astronauta. Passei minha vida inteira aprendendo e trabalhando em atividades nessas áreas: técnica e operacional. Também adquiri experiência administrativa ao longo dos anos nos projetos que trabalho no programa espacial e defesa. Contudo, tudo sempre voltado para a área técnica. Política não faz parte do meu currículo.
Sem dúvida, acho a atividade política de extrema importância para todo o andamento do país. Isso é lógico. Um tanto acentuado no Brasil, mas é fato no mundo todo. Como citei anteriormente, também compartilho os mesmos sonhos e esperanças que renascem a cada eleição para todos os brasileiros. Entendo e respeito, portanto, os questionamentos e pedidos que recebo do público para ingressar na carreira política.
Porém, a minha atitude pessoal e profissional é pautada em precisão de engenharia, números, projetos, procedimentos determinados, objetivos, planejamento, treinamento e resultados. Essa diretriz determina, portanto, como extremamente essencial, a correta preparação para qualquer pessoa executar, de forma eficiente, qualquer atividade.
Transfira essa diretriz de atitude para a esfera e importância das decisões da atividade política, afetando diretamente a vida de milhares ou milhões de pessoas, e tenha assim uma idéia do nível de preparação que eu considero essencial antes de sequer cogitar atuar nessa área. Conhecimentos adequados em sociologia, história, economia, administração pública, direito, etc, nunca fizeram parte do meu dia-a-dia. Simplistas poderiam até dizer que a inteligência e o bom senso são as únicas habilidades necessárias e que o conhecimento seria adquirido durante a prática. Discordo. O tempo de mandado é curto e não é para aprender. Traduzido no meu universo de atividades, imagine que o piloto do seu vôo na ponte Rio-São Paulo diga que aprenderá a voar durante aqueles 45 min? Preparação é necessária.
Aqui na NASA, represento o Brasil no setor técnico do Programa da Estação Espacial Internacional (ISS). No espaço, representei 180 milhões de pessoas, durante a primeira missão espacial do governo brasileiro. São responsabilidades enormes. Contudo, eu estudei profundamente as atividades e me preparei muito para realizá-las. Foram anos de dedicação. O resultado foi a execução sem qualquer erro operacional da missão Centenário e a continuidade atual da participação brasileira na ISS. Esse é o meu trabalho, e continuo aqui, à disposição do Brasil, para executar outras missões se o país precisar. O cenário político é um outro universo para mim.
Além da falta de preparação adequada, também existem outros dois pontos importantes: o tempo disponível para preparação e o conhecimento profundo de uma causa social.
Quanto ao tempo disponível, no planejamento atual das minhas atividades junto a projetos espaciais, de defesa e sociais, eu não teria condições para a preparação adequada e trabalho político.
Com relação à definição de objetivos, só vejo como válida a participação de qualquer um na carreira política quando baseado em uma forte razão social, enraizada na comunidade representada por ele(a) e de seu total conhecimento.
Minha paixão é a educação, e pretendo atuar muito nessa causa social. Contudo, apenas recentemente tornou-se possível a minha participação ativa nesse setor. Assim, embora já esteja definida e certa essa minha “missão” com a educação do Brasil, ainda não tenho o cenário completo dos problemas da área para que eu possa analisá-los e determinar, com precisão, qual seriam exatamente os meus objetivos na área política para ajudar a resolvê-los.
Portanto, em resumo, no momento trabalho em muitos projetos e planos, mas todos nas áreas técnica e social, nada político. Uma carreira política só seria possível quando eu tiver todas as condições e preparação que considero essenciais para tal, conforme descrevi acima. Conhecendo o nível de exigência que determino para a minha performance pessoal e profissional, é possível que isso nunca aconteça, visto a dinâmica de minhas outras atividades pelo país.
Assim, finalmente, para todos aqueles que tanto querem e solicitam que eu participe da área política, eu peço desculpas, mas isso não vai acontecer no momento. Não é “fugir da raia”. Quem me conhece bem sabe que aprecio, e muito, encarar desafios novos. Porém, pelas considerações acima e pelo potencial atual de minha contribuição nas atividades no setor tecnológico e social para o Brasil, deixo essa “missão” política para aqueles que realmente estão no nível de preparação necessário para assumi-la a partir de Outubro.

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